Talibã e o Futuro da Ciência no Afeganistão

     A tomada de Cabul, capital do Afeganistão, pelo grupo extremista Talibã na última semana destituiu o governo afegão em prol de um governo baseado no fundamentalismo islâmico, que implica em nacionalismo e um seguimento radical às leis do islã. O mundo inteiro tem se mantido atento ao decorrer dos dias na região e muitas dúvidas sobre o futuro surgem na comunidade internacional, principalmente em aspectos como direitos humanos, direitos das mulheres e possíveis guerras no Oriente Médio com impacto global.

    No meio do caos, a ciência afegã também pede socorro. Cientistas ouvidos pela revista Science, uma dos mais importantes periódicos científicos do mundo, relatam que já sofreram ameaças e ataques por terroristas ligados ao grupo. Os depoimentos incluem descrições até mesmo de atentados a bomba sofridos pelos pesquisadores em seus ambientes de trabalho.

   Desde que o Talibã governou o Afeganistão pela última vez, de 1996 a 2001, as instituições de ensino superior do país cresceram de algumas unidades para mais de 100, e as mulheres entraram no mercado de trabalho em massa. Os líderes atuais do Talibã insistem que moderaram seus pontos de vista, mesmo quando juram reimpor a sharia, a lei islâmica que rege contratos comerciais, o modo de vida dos que seguem a religião e até mesmo proibições relacionadas à alimentação e punições. Mas poucos afegãos estão dispostos a aceitar essas garantias. Ainda em 2016, um ataque de supostos combatentes do Talibã na Universidade Americana do Afeganistão matou 13 pessoas e feriu mais de 50.

    Pesquisadores ouvidos dizem que é improvável que um regime do Talibã sem dinheiro pague salários a professores e funcionários de universidades, como aconteceu durante seu governo anterior. Eles também mencionam grandes chances das instalações acadêmicas sejam saqueadas. "A vida acadêmica parece ser inimiga da ideologia do Talibã", dizem os mesmos pesquisadores, que continuam: "Os lutadores comuns são, em sua maioria, garotos que sofreram lavagem cerebral e saíram dos madrassahs. Eles são treinados para pensar apenas em duas coisas: céu e inferno.” 

    Em um sinal de que o Talibã pretende assumir o controle das universidades, no início desta semana o grupo instalou seu próprio reitor na Universidade Paktia em Gardez. Como diz outro pesquisador ouvido pela Science, "um sistema educacional vazio é uma perspectiva muito assustadora, pois pode criar um terreno fértil para os jihadistas." 

    Pesquisadores e governantes dos Estados Unidos e da Europa têm se mobilizado para dar asilo a pesquisadores afegãos em situação de risco, mas o cenário é perigoso e incerto. E mesmo com a possibilidade de refúgio, deixar o país e ver tudo que foi construído por estes pesquisadores nos últimos anos é doloroso e devastador, nas palavras deles próprios. "A perda de tudo pelo qual arriscamos nossas vidas", completam.


Saiba mais:

‘I don’t want to die.’ Afghan researchers fear for their safety—and the future of science

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